Ler os ideogramas, ou falar nos quatro tons de pronúncia que o idioma mandarim exige, para nós brasileiros não é tarefa simples. Mas, também é muito difícil para os chineses aprenderem a conjugação verbal do português.
No caso deles, são cerca de 60.000 símbolos que representam palavras ou fonemas naquela língua, sendo que atualmente são usados em torno de 10.000. Estima-se que, para ler um jornal, é preciso conhecer ao menos 2.500 caracteres. Uma pessoa culta consegue identificar entre 3.500 e 5.000 ideogramas.
Lembro disto, em razão de, às vezes, ser tão complicada a comunicação entre pessoas que possuem um domínio de razoável a bom do idioma, que mais parece que os interlocutores falam línguas completamente diferentes.
Será que o que eu digo, é aquilo que a outra pessoa ouve? Ou, vice-versa, será que o que o outro fala é aquilo que eu ouço? Será que quando eu digo que entendi a argumentação do outro, não estou equivocado?
A tão desejada comunicação nem sempre se estabelece plenamente graças a determinadas nuances que, muitas vezes, não são consideradas pelo emissor da mensagem, nem pelo receptor dela. Cada cérebro registra e tem registrado conhecimentos, experiências, conceitos, pontos de vista específicos e únicos, que nem sempre fazem parte do universo dos interlocutores. E não me refiro aqui às questões de regionalismo, nem de desconhecimento de palavras, mas de naturais divergências de conceitos, valores, modos de ver e entender as coisas.
Por esta razão, e tantas outras mais, é que corremos o risco de pensar que estamos sendo muito objetivos, claros nas nossas colocações, mas na realidade é como se estivéssemos falando javanês, ou mandarim, para uma pessoa completamente alheia a esses difíceis idiomas.
A questão da falta de entendimento entre os interlocutores (e nisso muito provavelmente em todos os idiomas), não é a de se repetir exaustivamente (ou não) o que se está querendo comunicar, mas de não se respeitar as sutilezas do universo interior da outra pessoa.
Um outro drama, que traduz-se por grande ruído na comunicação, é acerca do ritmo que eu quero dar à fluidez de meu vocabulário, e de minhas ideias, que nem sempre convergem com os de meu interlocutor. Se, durante um diálogo, me expresso atendendo a velocidade em que eu penso, posso tropeçar na articulação das palavras, porque pensar é muito mais rápido do que falar; se, ao contrário, levo mais tempo refletindo, pensando no que preciso dizer, o papo fica enfadonho, monótono.
Uma outra situação comum, que ocorre quase sempre, e que merece esforço para ser modificada, é aquela em que alguém, antes de ouvir com atenção e isenção, já está estabelecendo estratégias para se contrapor ou desqualificar os argumentos do outro, como se o ideal fosse “ganhar a conversa”, como se competir fosse mais importante do que comunicar, se entender o que está sendo dito. Perde-se tempo, e energia, numa espécie de duelo mental, cansativo, improdutivo, cruel, desgastante, e que, até, pode descambar para a antipatia, e a malquerença.
Assim, um quer comunicar, e o outro se fecha em argumentações silenciosas, mas que formam imensas e intransponíveis barreiras para o entendimento desejável.
E mais, a questão aqui apontada não é de erudição vernacular, de saber falar bonito, de dizer palavras difíceis ou fáceis, mas tão somente de sensibilidade e habilidade suficientes para se estabelecer uma espécie de ponte entre um cérebro e outro, de forma a facilitar a transmissão boa e útil das ideias.
Isto, evidentemente, quando estamos cogitando de se comunicarem questões objetivas. Agora, se o propósito for de tratarem-se de questões subjetivas, como sentimentos, a situação é mais complicada ainda.
O hiato entre pessoas, a solidão entre conviventes, se estabelece nessa medida, exatamente porque não se considera que falar, ainda não é comunicar. Falar é o início de um processo de comunicação, que exige compreensão, muito antes de inteligência aguçada, ser bem informado, ou ter bons ouvidos.
Em sua obra-prima, “A Rebelião das Massas”, o filósofo espanhol, José Ortega y Gasset consignou sobre a impossibilidade do entendimento entre as pessoas, estando, todos nós, condenados a uma espécie de “solidão radical”.
Jonas Paulo
jonaspaulo44@gmail.com.